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sábado, 2 de janeiro de 2016

O Babá é bom na bola, e o pai dele no jucá ( Flamengo, 120 anos de glórias )


                        Mário Braga Gadelha - Babá  ( 1934 - 2010 )
 
 
                                                                                                                                                                      
          A cidade onde eu estava morando em 2009 - Caucaia, Ceará (antiga Vila de Soure)-, vinha de um momento eufórico,  com o título do Brasileirão conquistado pelo Flamengo sobre o Gremio portoalegrense.  Não apenas pelo fato de que o Flamengo, historicamente, é o clube de maior torcida no Estado do Ceará, mas principalmente pelo  decisivo gol ter sido marcado pelo zagueiro central Ronaldo Angelim, criado na região do Cariri.
          Como bom rubro-negro, achei oportuno naquele momento, aproveitar todo aquele clima que contagiava a cidade, e entrevistar um dos mais notáveis jogadores do passado ,- Babá, para que ele pudesse falar um pouco sobre sua carreira, sua relação com o Clube de Regatas do Flamengo,  que o projetou nacionalmente , pelo qual honrou vestir a camisa 11 por quase uma década, e sobre a recente conquista do Brasileirão.
          Esta entrevista já estava prometida desde 2008, mas em decorrência de um AVC  que Babá havia sofrido, aguardei pacientemente esses dois anos , para enfim conhecer e prosear com aquele "pequeno notável" .

 

          Não cheguei a ve-lo jogar no Maracanã, pois quando Babá transferiu-se do Flamengo para o UNAM do México, eu tinha apenas 5 anos de idade. Mas lembro de meu pai e tio falarem de Babá, como um meia-esquerda infernal, com futebol superior ao de Zagalo, embora todas as atenções da torcida se voltassem para a genialidade do meio-campista Dida. Contavam que nos tempos de Fleitas Solich, a dupla Joel e Babá foi determinante para desestruturar o forte esquema tático do Fluminense ( e seu sistema WM) levando o Flamengo a seu segundo tricampeonato estadual (1953-54-55).



          Eu só viria conhecer (e pisar no gramado) do Maracanã aos 7 anos de idade, levado pelo meu tio, o repórter-fotográfico Ernesto Carvalho, no clássico Botafogo 3 x meu Flamengo 1, com um show à parte de Garrincha.
          Mas, para minha e nossa felicidade ,  a recuperação do acervo filmográfico dos cinejornais e do Canal 100, nos permite,  hoje ver um pouquinho do vistoso e eficiente futebol jogado por Babá ( minutos 00:06, 06:02, 08:50 e 12:26), apesar da derrota rubro-negra para a equipe de Pelé.



                                                                     Santos 3 x 2 Flamengo ( 12/04/59 )

           Em seu úlimo ano pelo Flamengo, Babá foi decisivo durante a primeira fase do Torneio Rio-São Paulo, contribuindo para a primeira conquista de certame pelo clube da Gávea, marcando 3 gols , dois dos quais sobre o Vasco.
           Como dizia meu pai, chegava a ser dantesco o confronto local entre rubro-negros e vascaínos, quando Babá, com  apenas 1,54 de altura fazia seus gols de cabeça nas disputas contra o zagueiro vascaíno, o grandalhão Eli (do Amparo).
           Falava Babá , durante a entrevista, que ele e seu pai, ajudaram a popularizar o Flamengo na cidade onde moravam, promovendo  duas excursões dos rubro-negros  em Caucaia: uma em 1951, ano em que Babá ainda era amador, pelo clube criado por seu pai, o Payssandú. A segunda, em 1956, com Babá já consagrado como tricampeão pelo Flamengo. Foram os anfitriões, hospedando a equipe rubro-negra na casa de seu Gadelha.
            Coincidentemente, morei na Rua José de Pontes, no Açude, região central da cidade, exatamente na antiga propriedade do velho Gadelha, onde havia o pé de sapoti, que Babá comenta ter sido o local onde o Flamengo se hospedou.
           Além de outras passagens curiosas, revelou sobre as dificuldades no início de sua carreira, e o decisivo apoio de Marinho (pai de Paulo Cesar Cajú) para que ele se firmasse como jogador e ascender às equipes de ponta do Nordeste : Ceará e Bahia.
           Apesar de sua baixa estatura, tornou-se exímio cabeceador, tornando-se o carrasco do São Paulo e Vasco da Gama.
           Em sua passagem gloriosa pelo Flamengo, Babá marcou 89 gols, tonando-se o 26º artilheiro do Flamengo. Em 1995 foi agraciado com o Troféu Belfort Duarte, concedido somente a jogadores que, por disciplina, jamais foram expulsos de campo. No ano de 2000, Babá deixou sua marca na Calçada da Fama.


          Em respeito à sua memória,  mantive o compromisso firmado com ele, de editar a entrevista, cortando alguns trechos de seu próprio depoimento que poderiam gerar algum constrangimento a terceiros, particularmente sobre a fama de alcaguete de seu xará , -Mário Jorge Lobo Zagalo, que entregava o nome dos colegas de equipe que fugiam da concentração para curtirem as noites cariocas. Embora cortadas estas suas falas, me atrevo ( sem romper o compromisso) de revelar que além da antipatia que Zagalo adquiriu junto aos atletas rubro-negros, por ser um dedo-duro, possuía a estranha mania de enfiar o dedo no fiofó dentro do vestiário, antes das partidas, ficando assim, dito apenas por mim.


 
(esse vídeo foi gravado por Maicoln e editado pelo Studio Cristiano Alleson)




         Babá, muito bem humorado, me falou de sua juventude , dos bailes de forró e xaxado  promovidos por seu pai, dono do clube Payssandú, e que quase sempre terminavam em pancadaria. Diziam os mais antigos, como seu Zé Américo, que o velho Gadelha, só andava com o cipó do jucá na cintura. E desses furdunços surgiu uma marchinha "pé de serra" que ficou famosa no início da década de 50 , cuja letra segue abaixo:

- ..." Lá pra Caucaia por Babá fui convidado
pruma dança de xaxado na casa de um tal de Zacarias
Houve uma briga, dez no chão, quinze estirados
também vinte amarrados
pra morrer no outro dia
e só se ouvia os estalos do Jucá (  ¹ )
E os gritos : fura ele !
Bota o sangue pra qualhar
e até um cabra valente lá do Iguatu
da carreira e do medo
trepou-se num pé de mandacaru

é de morte a terra do Babá.

O Babá é bom de bola
e o pai dele no Jucá.
O Babá é bom de bola
e o pai dele no jucá. "

( ¹ ) jucá ,Ayucá, cipó mukuru : é um arbusto que associado ao sumo do juremeira produz efeito alucinógeno, muito utilizado em rituais pelos índios Tapeba, de Caucaia (antiga Vila de Soure) ... O termo AYUKÁ deriva do tupy antigo "AIUCA" que significa "espremer massa com as mãos para retirada de sumo" e alude ao preparo da bebida sagrada do ADJUNTO DA JUREMA. O radical "AYUK" no Tupy-Antigo equivale ao radical Sânscrito "YUK", com o significado de "UNIR"...radical este presente na formação de termos muito significativos como "YOGA" (no Sânscrito), "JUNGIR", "ADJUNTO", "JUNTAR" (no Português), "YOKE", (no inglês) , "JO-AYUK" (no Tupy), sempre no sentido de JUNTAR, UNIR, TORNAR UNO....Assim, alude tanto ao preparo do chá (Através da UNIÃO entre as duas plantas) como também ao que se pretende obter através da alquimia do AYUKÁ....A UNIDADE DO SER. (o cipó é duro qual o cacête baiano)

            Grande craque, amigo dos amigos, pai exemplar, avô-coruja, e querido pela gurizada, Babá deixa saudades naqueles que o conheceram.  Lesado em seu patrimônio por um advogado/empresário inescrupuloso, restou-lhe dos tempos áureos do futebol, a casa onde morava e seu carro. Tudo o mais, para manter sua família, foi buscar como trabalhador comum, aposentando-se pela PORTOBRÁS(não confundam com Petrobrás).

       E para a imprensa esportiva,  a "especializada" que costuma ser descuidada com o que escreve e que insiste em afirmar que até hoje é um mistério como se deu sua contratação ao Flamengo, em fins de 1953, o próprio Babá desfaz o mistério : Babá, aspirante ainda, encontrava-se  suspenso pelo Ceará S.Clube, quando o Flamengo interessado em seu concurso desembolsou 15 mil cruzeiros 
para cobrir a multa contratual .            



            Nestes seus últimos dias queixava-se apenas das limitações físicas advindas do AVC, que o impediam de "bater os rachas" no campinho society do Gremio Caucaia e de não poder mais tocar seu projeto de Escolinha com a gurizada. 

            Embora eu tenha trabalhado em alguns jornais, como correspondente, pauteiro, e freela, não sou repórter e nem possuo formação em Jornalismo. Enquanto era possível (até 1985), possuía meu registro no Mtb.  Com a regulamentação da profissão, enfiei minha viola no saco e fui tocá-la noutro lugar. Portanto, não esperem  profissionalismo nesta entrevista feita por um simples torcedor  apaixonado com a única intenção de reverenciar, ainda em vida um ídolo do passado.
            Infelizmente, não houve  tempo hábil para que eu desse continuidade em uma segunda entrevista, já com todo o seu acervo de jornais e fotos . Fui informado recentemente que um"malandro"  apossou-se indevidamente deste acervo de Babá.
           A entrevista foi concedida pelo querido Babá (ou Anão Zezinho) , no dia 9 de dezembro de 2009, tres dias após a conquista do Brasileirão pelo CR.Flamengo.
           Quatro meses depois desta entrevista (sua penúltima), em 08 de abril de 2010, dia de concentração, Babá partiu ao reencontro com seu amigo Dida para um rachão lá no céu...




 Pixinguinha -   Um a zero
 

Alberto Santos ( o Carioca )


                                                     
Flamengo - 120 anos de glórias
 
 
 




 
 
 
 
 
                                                                                                                             
             

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