Páginas

terça-feira, 12 de maio de 2015

Padre Hugo de Itaborahy: educação, política e futebol





      Padre Hugo de Itaborahy:
     educação, política e futebol



Recentemente me avistei com uma antiga professora da cidade, Dona Wilca. Após uma hora de reminiscências sobre Itamby, pedi-lhe para rememorar como eram os festejos de São João na velha Iaborahy. Me contou em detalhes sobre todos os preparativos da festa, as quermesses, sobre a doceira da festa, das barracas, o cortejo da procissão, o leilão. Reproduziu fielmente tudo que viu e viveu nos idos de 1955, quando ainda tinha 22 anos. Citou ainda o nome de Adail Bento, que havia restaurado a Igreja Matriz.

Foi quando perguntei-lhe sobre o vigário à época. Eu já tinha seu nome em meus arquivos fazia um bom tempo mas o havia guardado para um momento mais oportuno. Porém , diante de um depoimento de quem o conheceu e com juízo de valor  bem definido , decido-me a escrever algumas poucas  linhas sobre a trajetória desse padre na região.

Segundo a professora Wilca  S. Ferreira, padre Hugo possuía uma personalidade muito forte e considerado muito polemico. A velha Itaborahy, provinciana, demoraria a se acostumar com um padre que chegara à cidade montado em uma moto e que não se curvaria ante os gostos da oligarquia local. 
Embora muito popular, não foi uma unanimidade, principalmente quanto às reformas na estrutura física das igrejas , que segundo os estudiosos, as descaracterizou ( em particular , a Igreja Matriz de São João Baptista e a de São Barnabé).

Não tardou para que este novo vigário implacasse seu próprio estilo junto à tradicional paróquia.

Padre Hugo Montedonio Rego, natural de Minas Gerais . Formou-se em Congonhas e cursou Filosofia na Holanda com padres redentoristas. Extremamente culto, conhecera a Europa e contava em seu currículo uma viagem automobilística entre o Brasil e os EUA, conduzindo um padre cego para um transplante de córneas.

Foi nomeado pároco de Itaboraí no ano de 1947.

Para além do sacerdócio , padre Hugo do Rego, foi um fervoroso e incansável combatente da causa educacional. Criou e dirigiu um educandário, o Pio XI, e eleito várias vezes para compor a CNEG- Campanha Nacional de Educandários Gratuitos (atual CNEC).

Já em 1943, Padre Hugo havia criado uma mantenedora- a Sociedade dos Educandarios de Cantagalo, com o fito de garantir o funcionamento de um colégio, o Ginásio Euclydes da Cunha.

Em Itaboraí não foi diferente. Dedicou-se com afinco na criação do Ginásio Alberto Torres, que a princípio, funcionava apenas à noite utilizando salas cedidas pelo governo estadual, no vizinho Grupo Escolar Visconde de Itaborai. A campanha de doações empreendida por Padre Hugo , bem recebida pela comunidade , atingiu a cifra de 50.000 cruzeiros, e então foi lançada a pedra fundamental do prédio próprio em setembro de 1949.

E assim , em 18 abril de 1951, surgia o atual CAT- Colégio Alberto Torres, que em seis décadas tornou-se referencia educacional na região, com altos índices de aprovação em vestibulares públicos.

Se sua atuação na área da educação era bemquista, não se pode dizer o mesmo na esfera da “ boa política ”, a da submissão à classe política. Padre Hugo ousou desafiar um dos chefes da política local, nada menos que o Secretario de Segurança Pública do Estado, Leal Junior, ao recusar-se a aceitá-lo com padrinho de batismo de uma criança. Tornou-se seu  desafeto.

Na ocasião, respondeu ao desembargador, de forma taxativa : “ "o senhor sabe muito bem que a lei canônica impede que maçons participem diretamente de atos católicos....só o aceitarei como padrinho caso o senhor renegue a Maçonaria.”

A ira dos Leal aumentou, quando a esposa de Leal, dona Margarida, teve recusado um outro pedido de “prioridade” em batismo. Não tardaram as retaliações.

Em setembro de 1954, a paróquia foi alvo de atentado à bala, fato atribuído aos queremistas chefiados por João Augusto de Andrade (irmão de Margarida Leal), e derrotado nas eleições.

Padre Hugo do Rego teve atuação marcante não só em Itaborai, mas também na hoje vizinha Tanguá e em Rio Bonito. Sua capacidade de articular doações de recursos e terrenos para a construção de escolas da antiga CNEG foram sem dúvida sua marca registrada.

Mas o fato mais inusitado de sua passagem pela cidade deva-se talvez à sua paixão pelo futebol, pelo Flamengo e sua genialidade em usar  o esporte bretão em favor da paróquia.

Pe Hugo do Rego, o polemico padre flamenguista

Para enfrentar as crescentes necessidades materiais da paróquia criou um jeito inovador e legítimo de angariar finanças. Em 1954, adquiriu uma TV e a instalou na sala de reuniões da igreja , franqueando o acesso às transmissões dos jogos mediante o pagamento de 5 cruzeiros por pessoa.

Logo viria sofrer uma campanha infame contra sua pessoa. O jornal que apoiava a família Leal estampava em suas páginas que “a TV funcionava na nave da igreja, que os espectadores depositavam seus chapéus por sobre as imagens, que havia falta de respeito e palavra de baixo calão no recinto”. Era 1954, ano extremado pelas disputas eleitorais.

Padre Hugo defendia-se : “ Estou certo (as arrecadações do meu Maracanãzinho  atestam) de que a população católica de Itaboraí, encontrou na minha ideia, o meio compensador e suave de contribuir financeiramente para as obras da paróquia”.

E exaltava o sentido educativo das sessões de futebol pela televisão: “ ... teenho a impresso eu em volta de meu aparelho, estou formando e apurando o sentimento do verdadeiro torcedor que na generalidade descamba par o excesso, para as inconveniencias.... O peso do ambiente espiritual, em que se concentram os espectadores influi positivamente, anulando as explosões do homem apaixonado.” E continua ... “ De tal maneira que, disso me orgulho: meu público é o único no Brasil que assiste a um Fla-Flu sem soltar um palavrão”.

E informava orgulhoso: a arrecadação varia muito em função dos clubes, às vezes menos, quando o jogo é , por exemplo entre América e Bangu...  “ Mas quando é o meu Flamengo  chego a arrecadar aos domingos até 600 cruzeiros ”( um público de 120 paroquianos)
 * (neste ano de 54,  uma arquibancada no Maracanã custava 17 cruzeiros e o ingresso de geral 5 ) 

Padre Hugo entregando o Fogo Simbólico a Celio Barroso,
aluno do CAT, 31/08/1959

Era comum que Padre Hugo organizasse eventos culturais e esportivos, como a Corrida cívica e 50 kms entre Itaboraí e Cachoeiras de Macacu, em 1959.
O último registro de Padre Hugo que encontrei, continuava a frente do Educandário Pio XII, no ano de 1964.

As ter lágrimas - Antônio Campos Negreiro

 por Alberto Santos


                                                                
120 anos de glorias




Um comentário:

Obrigado pela visita!