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segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

RIEMER E OS DOUTORES DA BOLA

    RIEMER E OS DOUTORES DA BOLA



(por Alberto Santos )                              " cobra-coral , papagaio vintém, vesti rubro-negro, não tem pra ninguém " 


Ao findar o ano de 2014, não poderia deixar de fazer um registro especial sobre o centenário do primeiro título terrestre do Clube de Regatas do Flamengo. E o faço reverenciando a memória de uns dos maiores artilheiros rubro-negros de todos os tempos:
  
                                   Riemer .


Ricardo Guimarães Riemer, nascido no Rio de Janeiro em 07 de junho de 1884, iniciou sua prática esportiva ainda estudante, defendendo a equipe de futebol do Colégio Paula Freitas.
Em 1910, inicia-se como amador pelo Hadock Lobo F.C., em 1911 pela equipe do S.C. Mangueira, acessos à 1ª divisão . Os livros não falam, mas Riemer também chegou a jogar algumas partidas pelo Fluminense em 1911, e pertenceu ao mesmo grupo de Borgeth, que debandou das Laranjeiras. Ajudou a criar o Departamento de Esportes Terrestres do Flamengo, porém  optou por jogar inicialmente no América, em 1912.¹
¹ em abril de 1912, em jogo-treino o América enfrentou o Flamengo., cabendo à vitória ao rubro-negro por 2x1, gols de Gustavo e Baihano. Riemer , pelo América, marcou o 1º gol da partida.
Até então , sua passagem pelo futebol fora discretíssima.
Foi quando em julho de 1912, é inscrito na AMEA, pelo C.R. do Flamengo, para disputar o certame carioca de 1913.
Em menos de dois anos tornar-se-ia ídolo rubro-negro, ao conquistar o 1º título de futebol  do clube e alcançar a co-artilharia do campeonato, com 8 gols. Embora fosse médio-volante , tornou-se artilheiro: tinha um potente chute . Qundo a bola vinha no jeito, Riemer ficava meio de lado, usando a perna direita como encosto, muleta. E aí pegava de bate-pronto aquela “paulada”. Por isso ganhou o apelido de perna-de-pau.
E dizia:  que diabos ! Eu sou inside left( quer dizer, meia-esquerda) não sou?
Nos anos que se seguiram, tornou-se o maior artilheiro rubro-negro da década de 10. Ao total de sua carreira no clube marcou 55 gols em 68 partidas, alcançando a média de 0,81 com por  partida (esta é a 4ª melhor média  até  hoje). É dele ainda o maior média histórica de gols em Fla-Flus : 1,08 , com 13  gols no total. Pela média, é o maior carrasco do Fluminense até os dias de hoje.
Dividiu glórias com os companheiros daquele poderoso scratch que tinha por base: (²) Baena, Píndaro e Nery; Lawrence Andrews, Amarante e Gallo(Arand de Almeida); Baihano, Riemer e Borgeth; Gumercindo e Arnaldo... Outras formações durante a competição contavam ainda com Coriol(Coriolano), Angelo, Miguel, Raul, Sidney, Paulo Buarque,Milton, Orlando, Gustavo, Barra , Joca , Pinho, , Zé Pedro e  Antonico.
{ Um detalhe curioso é que às vezes era escalado um jogador chamado Borja. Na verdade Borja era o pseudônimo utilizado por Borgeth, pois já era formado em medicina e sua família não queria que ele continuasse jogando futebol. Assim, Borgeth pedia aos repórteres que o identificassem como Borja.}
                                                  

A partir de 1919, passa apenas a participar dos torneios  internos do clube.
Já em 1913, dividia seu tempo entre o Flamengo e a Faculdade Nacional de Medicina, onde concluiu seu curso em 1919. Em 1914, ainda participava de jogos pelo Acadhemicos, equipe de futebol da Escola de Medicina.
    ( jovens associadas do C.R.Flamengo pousam para foto, antes do baile dançante. Muito glamour na comemoração do 1º título terrestre )
Em 1920, já formado, casa-se e abandona o futebol para exercer seu ofício como médico : primeiramente como sub-inspetor do Hospital Sanitário Marítimo, posteriormente assumiu a direção da Hospital de Clínicas Médicas para homens (do Souza Aguiar), onde aposentou-se compulsoriamente em 1964. No ano de 1943,  em decorrencia da II Grande Guerra, é nomeado  Major-Médico do Exército.
Seus últimos dias, revelam toda sua paixão pelo Flamengo. Entrevistado dias antes de seu falecimento, revelou algumas  boas histórias.
Riemer advogava uma teoria sobre a popularidade de Flamengo em todo o país. Dizia ele que esta popularidade se devia à equipe de 1914, pelo fato de que a maioria dos atletas desta equipe (Píndaro, Nery, Angelo, Miguel, Arnaldo, Gumercindo, Raul, outros ...) como ele, formaram-se em Medicina, e que passaram a atuar nos vários rincões do Brasil, e onde estabeleciam  seus consultórios, instalavam na porta de entrada  o escudo e a bandeira do Flamengo. Por conta disso, a maioria dos pacientes, por vezes tratados gratuitamente , indagavam curiosos sobre o que era aquilo, e sabendo tratar-se da paixão dos médicos que os atendia , acabavam por simpatizar com o clube, sem mesmo te-lo visto jogar.
                                     (torcedores no ground Payssandú)


Lembrou dos velhos companheiros de equipe, dos quais restavam vivos apenas ele e Gallo (funcionário do clube), escalou para o repórter, a verdadeira equipe-base de 1914 (*), e revelou seu apelido no clube : perna-de-pau, pois suas pernas eram compridas e muito finas, além da potencia de seus chutes.
Riemer teve três filhos: Roberto, Regina e Rosina. Esta última residente nos E.U.A.
Nunca abandonou sua paixão pelo futebol e pelo Flamengo. Contava ele, que ao casar, sua esposa , Dona Raquel Castro Riemer (cantora lírica/pianista) que detestava o esporte bretão, o reprimia de ir aos domingos nos jogos, pois achava um tremendo mau gosto assistir a homens correndo atrás de uma bola. Riemer encontrava o ‘jeitinho’ brasileiro  para driblar sua senhora. Servia-lhe após o almoço de domingo uma taça cheia de vinho tinto forte (possivelmente do Porto) e em poucos minutos ela adormecia, momento em que ele ganhava a rua para ir a São Januário. Dizia ele: voltava feliz pois quase sempre o Flamengo saía vitorioso.
No auge dos seus 71 anos , tinha como alegrias cuidar de seus pássarinhos, em seu apartamento da Domingos Ferreira, além de folhear revistas e fotos antigas de seus gols.
Com o tempo e com a idade chegando, passou a acompanhar os jogos somente pelo rádio.
Depois de anos, esta rotina foi quebrada  em agosto de 1965. Dias antes de seu falecimento, Riemer fora ao Aeroporto recepcionar a filha Rosina, o genro Lee e o neto Richard de 2 anos, e como surpresa, recebeu de Rosina uma camisa rubro-negra.
Empolgado com o presente que o fazia relembrar os gritos de “ dá-lhe, Riemer ! ”, entoados no passado pela torcida rubro-negra,  decidiu ir ao Maracanã.
Era uma tarde de domingo, 8 de agosto de 1965. Vestindo o manto ,  assistiu a seu último FlaxFlu . Seu último adeus ao mas querido. O jogo foi melancólico.  Riemer resumiu-o, curto e grossso :
“Achei a partida muito feia, nunca apreciei o  0 a 0.”
Esta foi a última frase de Riemer sobre o futebol   .
Para um artilheiro nato , uma partida sem gols é de doer o coração. E quatro dias após o coração do artilheiro parou de bater. Nas palavras do repórter, “ ... o coração velho e fraco, terminou ontem , por defaslecer o Flamengo, de mais um dos homens que viram o nascimento de uma paixão nacional .”Ficou só a memória do saudoso Riemer .

 ........ “ Uma vez Flamengo, Flamengo até morrer ! 

(²) O 1º time que se sagrou campeão e 1914 era: Baena, Píndaro e Nery; Angelo, Miguel e Armando; Arnaldo, Gumercindo e Orlando; Riemer e Raul.

... e imaginar que tudo começou com a baleeira Pherusa em 1895 ...

2 comentários:

  1. Muito boa a pesquisa ! Sou neta do Riemer e nem sabia de tantos detalhes !
    Somente um engano - O filho primogênito do Riemer se chama Roberto Riemer e é meu pai. Ele foi um grande jogador de praia, pois seu pai não quis que ele seguisse a profissão de jogador. Meu pai como advogado foi um excelente jogador de praia que parava a todos com seus dribles e equilibrismos com a "Leonor" - era como se chamava sua bola ! Obrigada pela homenagem !! Abs., Vera Riemer

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    1. Obrigado pelo comentário e pela correção. Vou pesquisar sobre a Lonor.. rs Abs

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